22º Encontro Nacional de Deficientes

Começo por agradecer à CNOD o convite para intervir no 22.º Encontro Nacional de Deficientes e saudar todos os companheiros de luta aqui presentes.

“Para permitir às pessoas com deficiência viverem de modo independente e participarem plenamente em todos os aspectos da vida, os Estados Partes tomam as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em condições de igualdade com os demais, ao ambiente físico, ao transporte, à informação e comunicações, incluindo as tecnologias e sistemas de informação e comunicação e a outras instalações e serviços abertos ou prestados ao público, tanto nas áreas urbanas como rurais.”

Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

Caros amigos,

Como a APD vem referindo ao longo dos anos, o desenvolvimento sustentável do País, quer económico quer social, terá de passar por uma intervenção decidida ao nível das condições de acessibilidade e mobilidade, que assegure a qualidade de vida de todos os cidadãos, bem como a competitividade no contexto regional, nacional e internacional.

A estrutura da nossa sociedade não corresponde, do ponto de vista físico, informativo e comunicacional, às reais necessidades da população (pessoas que não falam nem lêem português, pessoas com dificuldades de orientação espacial, pessoas que transportam pesos, crianças, idosos, pessoas com deficiência, grávidas, pessoas que transportam carrinhos de bebé, etc.), que vêem a sua mobilidade condicionada pelos obstáculos com que se deparam nos caminhos da sua vida.

Um País planificado para todos – assegurará a inclusão dos seus habitantes. Será esta a realidade em que as actividades económicas, culturais e sociais estarão facilitadas, em que não serão necessários tantos investimentos em equipamentos especiais. Uma visão de curto prazo, de poupança no imediato, só trará custos acrescidos no futuro próximo. Não só custos económicos, mas também sociais que decorrem da exclusão de parte significativa da população.

Embora em Portugal tenha havido nos últimos anos alguma preocupação em legislar sobre as questões da mobilidade e não obstante ter sido aprovada legislação desde 1997, o certo é que, quer a inexistência de mecanismos reguladores desta legislação, quer os incumprimentos de que são alvo, permitem que subsistam muitas das condições de inacessibilidade do meio físico, dos transportes, da comunicação e da informação.
A publicação do Decreto-Lei 123/97, de 22 de Maio, abriu novas perspectivas às pessoas com deficiência, já que legislava a acessibilidade aos edifícios que recebem público e via pública.
Mas o seu cumprimento esteve longe de corresponder ao que o diploma estipulava e terminado o prazo concedido pelo Diploma para que fossem realizadas obras de acessibilidade, o Governo optou por aprovar nova legislação o que inviabilizou que os cidadãos ou entidades pudessem penalizar os infractores em Tribunal. Assim, surge o Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de Agosto, que revogou o Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio.
Este novo diploma , embora alargue as normas técnicas aos edifícios de habitação, contem aspectos gravosos, como o alargar o prazo legal para adaptações.
O seu prazo para adaptações termina em 2016, há que estar atento para que não suceda o mesmo que com o ultimo diploma.
Um ESTUDO DA DECO publicado na edição de Fevereiro de 2006 da revista DECO PROTESTE, sobre a acessibilidade em Portugal para as pessoas com deficiência motora, visual ou auditiva, revela:
– Que mais de 50% dos inquiridos referiu a impossibilidade de utilizar os transportes públicos; nunca ter andado de eléctrico, comboio, metro ou autocarro;
– A impossibilidade de recorrer a auxílio de terceira pessoa fora do agregado familiar;
– Mais de um terço dos inquiridos têm uma profissão, mas sentem dificuldade em desempenhá-la; 43 % apontam falta de condições nos acessos, 26 % falta de adaptação das casas de banho e 22 % obstáculos na circulação;
– Mais de metade dos inquiridos disse que a maioria dos locais desportivos e de convívio não têm condições para se movimentarem;
– Cerca de metade nunca navegou na Internet e muitos sítios da rede ainda não têm descrição áudio, comando verbal, interpretação gestual ou legendas para facilitar a comunicação;

Que mais de metade afirmasse ter dificuldades em aceder a um hospital e 46% aos centros de saúde dá a exacta medida do caos que grassa ao nível das acessibilidades e, consequentemente, das limitações no exercício dos direitos mais elementares imposto pela inacessibilidade do meio, da comunicação e da informação. Todos temos consciência de que pouco mudou desde 2006 em termos de acessibilidade.

Um breve estudo efectuado em 2013 ao nível dos transportes públicos, em Lisboa, permite-nos ter uma visão mais aprofundada das dificuldades que se fazem sentir a este nível e pensar que quando a situação na capital é calamitosa, no interior é intolerável.

Carris – 50% da frota está adaptado. Há queixas de utilizadores que referem avarias sistemáticas dos elevadores e demora na sua reparação. Há também queixas de recusa por parte dos motoristas (que é legítima uma vez que estão proibidos de abandonar o volante) para acionar a plataforma elevatória, uma vez que, em grande parte dos autocarros, o sistema está colocado junto à porta de entrada do veículo.

Metro – 30 das 55 estações do Metro têm elevadores. Há queixas frequentes de avaria dos elevadores. O da estação do Rato está avariado há cerca de 1 ano, o que impossibilita o acesso a pessoas em cadeira de rodas e com canadianas.

Comboios – Um elevado número de comboios da CP a operar em Lisboa ainda não tem acesso. Na linha de Sintra os comboios que vão do Rossio para Sintra têm elevador mas os que circulam para outros destinos não têm acesso.

A proposta da Comissão Europeia integrada na comunicação sobre Uma Europa Livre de Barreiras para as Pessoas com Deficiência reveste-se de importância fulcral para o futuro dos cidadãos com mobilidade reduzida. Urge legislar, ao nível da Comunidade, a acessibilidade a todas as áreas dos transportes públicos (incluindo transportes ferroviários, rodoviários, aéreos, fluviais, marítimos e veículos privados). A Directiva 2001/85/CE, de 20 de Novembro, que refere as disposições especiais aplicáveis aos veículos destinados aos transportes de passageiros com mais de oito lugares sentados além do lugar do condutor, isto é, autocarros classe I, transposta para a legislação nacional pelo Decreto-Lei n.º 58/2004, de 19 de Março, veio colmatar, ao nível das cidades, a deficiente oferta de transportes rodoviários adaptados o que se irá verificar ao longo dos anos, uma vez que só se aplica na aquisição de novos veículos.

Para além das questões da mobilidade física, importa referir que as pessoas com deficiência, particularmente com deficiência auditiva, visual ou com dificuldades de aprendizagem, enfrentam sérios obstáculos no acesso à informação e comunicação, tornando-os particularmente vulneráveis, se considerarmos a importância e velocidade a que circula a informação na sociedade actual.

O Parecer do Comité Económico e Social sobre “A integração das pessoas com deficiência na sociedade”, refere que quando adequadamente desenvolvidas, as novas tecnologias podem desempenhar um papel essencial para suplantar os obstáculos com que as pessoas com deficiência se confrontam.

Este parecer remete-nos assim para as Ajudas Técnicas que, como é sabido já existem em todo o lado e adaptadas às várias áreas da deficiência e diversidade de ambientes. No entanto, o sistema de prescrição e de adjudicação é ainda moroso e pouco transparente.

A acessibilidade é uma questão transversal que tem implicações no acesso a actividades tão diversas como, a educação, a formação, o trabalho, a saúde, a cultura ou lazer, a participação cívica, entre outros, seja nas grandes áreas metropolitanas, seja nas vilas e aldeias do espaço rural, e atinge todos os estratos sociais e económicos da população portuguesa. Assim, decorre óbvia a importância de se planear, executar, monitorizar e avaliar uma Política de Acessibilidade e Mobilidade multinivelada horizontalmente (transversalidade sectorial) e verticalmente (a nível nacional, regional e municipal).

Setúbal, 8 de Novembro de 2014

22º Encontro Nacional de Deficientes

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